As letras de contestação às desigualdades sociais e de resistência ao autoritarismo, e outros tipos de desmandos, já vinham desde antes do samba. Porque a história da música popular brasileira se confunde, em muitos aspectos, com a luta do “povo sofredor” por sua
autodeterminação. E é também, muitas vezes, a crônica das desigualdades, cada vez mais gritantes, que flagelam as camadas subalternas da população brasileira, no seio da qual o samba nasce/renasce a cada década, desde o “Pelo Telefone”, em 1917.
Nesse panorama, a dialética ação/reação gera movimentos e espaços de resistência, nos quais a cultura popular, tendo o samba como um dos principais baluartes, vocaliza o fenômeno. Assim ocorreu, na Bahia oitocentista, quando o povo preto se apropriou da Festa do Bonfim, criada pela Igreja, e a formatou ao seu jeito, com seus sambas e suas comidas; da mesma forma que ocorreu com a Festa da Penha, em terra carioca. A enumeração é longa. E chega até a década de 70, com a reação dos “pagodes de fundo de quintal”, a fundação do Clube do Samba, liderada pelo compositor e cantor João Nogueira, e a criação do GRANES Quilombo, comandada pelo já legendário sambista Candeia.
Pois é disto, entre outros assuntos e por outros caminhos, que cuida este livro: do inestimável patrimônio cultural que se encerra na tão simples quanto diversificada rubrica “Samba”: dos espaços sempre resistentes que este samba semeou da Bahia para o Rio de Janeiro, e daqui para todo o Brasil e, mesmo, algumas partes do mundo. Além disso, os textos abordam o trabalho de alguns criadores exemplares, tanto pelo talento, quanto pela coragem de seu posicionamento ideológico e sua ação política. Tal qual ensinaram Paulo da Portela e outros “pais” do Samba; em lições que os autores desta obra aprenderam e nos transmitem muitíssimo bem.
Nei Lopes
POLÍTICA, SAMBA