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PTSC #3 :: Talitha Ferraz

Ela é jornalista, pesquisadora, cinéfila, poeta e tijucana. Talitha Ferraz é tudo isso e algo mais: a mais nova autora da mórula editorial. Ela publica conosco a segunda edição do seu livro “A segunda cinelândia carioca”, que trata dos cinemas de rua na Tijuca.

O livro é resultado da pesquisa de mestrado de Talitha. Ela deu continuidade à vida acadêmica e hoje encontra-se em Lisboa, estudando. Foi de lá e, tomara, acompanhada de um bom vinho, que ela respondeu ao PTSC desta semana. Com vocês, a complexidade deleuziana de Talitha Ferraz em cinco perguntas e um livro:

_Você escreveu um livro sobre cinema de rua. Por quê? Você gosta de cinema de shopping?
Escrevi um livro sobre cinemas de rua porque gosto de cinema de rua, apesar de ir também a cinema de shopping (com menos frequência), e porque estudei/estudo o papel que as salas de exibição cinematográfica, como equipamentos coletivos, têm no arranjo das cidades, nas configurações urbanas e na vida das pessoas. Acredito que as cidades perdem um pouco de sua vitalidade quando os cinemas saem das calçadas – dando lugar a igrejas, farmácias, ou quando são demolidos – e o acesso ao audiovisual cinematográfico em salas comerciais fica restrito aos grandes centros de compra, nos quais o consumo é a razão primordial. Um cinema de rua, por mais que se curve aos ditames do capital (é indústria, é comércio, ok…), deixa derramar um pouco de magia em seu entorno via cartazes, via letreiros, via filas, via pipoqueiro, via gente que fica na porta só olhando, via foyer que serve de ponto de encontro entre pessoas que às vezes nem estão tão afim de ver filmes, mas usam o equipamento que está com portas voltadas para a rua.

_Você acha importante preservarmos cinemas de rua?
Justamente para que tenhamos opções, para que o acesso aos cinemas não fique à mercê da existência de um shopping center, para que alguns prédios pérolas das arquiteturas art-nouveau ou art-déco não desapareçam ou virem igrejas protestantes, para que a gente possa um dia estar andando na rua, como quem não quer nada, e num relance ser invadido pela força cinematográfica. E outra coisa: as ruas têm que ser ocupadas por equipamentos culturais… Falo de sala de cinema, mas seria bacana se, por exemplo, o pessoal cineclubista pudesse ter acesso à gestão de algumas salas de cinema abandonadas. Seria bacana se pudessem existir mais cinemas a preços “baixos”, distribuídos por toda a cidade (toda no sentido de toda mesmo, não de “toda a cidade” no sentido de Zona Sul), tal como algumas iniciativas público-privadas vêm concretizando, com reaberturas e inauguração de salas.



UM LIVRO

“Não há movimento artístico que não tenha suas cidades e seus impérios, mas também seus nômades, seus bandos e seus primitivos.”

Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia
Gilles Deleuze e Félix Guattari
Editora 34, 1997

_Seu livro não é só sobre cinema de rua. É cinema de rua na Tijuca. Diz aí o que a Tijuca tem de especial.
A Tijuca foi o bairro do Rio de Janeiro que mais teve cinema, em meados do século XX, depois do Centro (Cinelândia). Foi um dos primeiros lugares no Rio a receber salas de exibição, ainda no perfil cine-teatro, em 1907. Há dados que indicam, inclusive, que a Tijuca teve até mais cinemas de rua do que a Cinelândia por um certo período. Mas para saber, tem que ler a pesquisa… E a Tijuca é a Tijuca! Bairro cheio de particularidades históricas muito fortes na vida do Rio de Janeiro.

_Um filme inesquecível visto num cinema de rua. Conta a história desse dia.
Eu frequentei os cinemas de rua da Tijuca quando ainda era criança e no início da adolescência. Depois disso, todos fecharam e viraram outra coisa. Sendo assim, as minhas memórias guardam as impressões sobre filmes aos quais assisti na tenra infância. Os da Xuxa e os dos Trapalhões, esses vi todos nos cinemas de rua da Tijuca, na Praça Saens Peña e arredores. Lembro-me de uma sessão em que fui assistir ao “Super Xuxa Contra o Baixo Astral” (eu gostava da Xuxa, não se sabe muita coisa sobre a vida quando se é criança e não, não, não: criança não é um ser sábio). Nessa sessão, a minha prima Luana chorou muito com medo do Guilherme Karan, que fazia o Baixo Astral. Naquele dia, eu fiquei um pouco irritada com o
choro dela, mas hoje vejo que ela tinha total razão em chorar.

_A gente sabe que você está fora do Brasil. “Do leme ao pontal, há algo igual”?
Não há nada igual do Leme ao Pontal, graças a Deus! E é por isso que o Rio de Janeiro é magnífico e sempre será a minha casa. Volto logo! Não vejo a hora de ter uma sensação térmica de 50°, embalando a escrita de minha tese sobre as extintas salas de cinema da Zona da Leopoldina, subúrbio do Rio, que defendo em março de 2014.

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