Temos em mãos um livro de peso: o peso da luta por justiça de oito famílias em luto; o peso de um levantamento de materiais sobre quatro décadas de chacinas (1980-2020); uma análise minuciosa sobre a atuação de agentes de segurança pública nas periferias de São Paulo e RMSP; cinco anos de pesquisa ética e politicamente comprometida com os movimentos sociais de familiares de vítimas da violência de Estado. Um livro que honra a memória de André, Edilsinho, Quadrilha, Markinho, Du Memo, Jhow, Mydras e Ferraz – vítimas fatais da Chacina da Torcida Pavilhão Nove, em 2015.
Professora há mais de uma década, Camila Vedovello nos ensina sobre a elasticidade dos processos de criminalização, através de diferentes escalas analíticas, compondo mapas georreferenciados de chacinas com o chão da quadra da torcida, na época localizada no baixio do viaduto Ponte dos Remédios, Zona Oeste da capital paulista — o chão onde o sangue das vítimas foi derramado. Entre lembranças de familiares e torcedores do Corinthians, notícias de jornal, acompanhamento das audiências do caso, pronunciamentos e documentos oficiais, Vedovello reconstrói também a história de uma torcida de futebol que ousou homenagear pessoas consideradas matáveis, segundo a lógica racista/punitivista institucionalizada em nosso país.
Produzido a partir de uma tese de doutorado vencedora do III Prêmio de Reconhecimento Acadêmico em Direitos Humanos Unicamp — Instituto Vladimir Herzog, este livro contribui de forma inquestionável para a luta contra o genocídio antinegro, travada dentro e fora das universidades brasileiras.
Juliana Farias
CHACINA, CRIME, VIOLÊNCIA